terça-feira, 10 de maio de 2011

As Três Marias...


Três eram as Marias que moravam às margens do Rio São Francisco, no cerrado mineiro, junto das veredas, buritis, pôr-do-sol, água vida do grande rio, ouvindo os cantos dos sabiás, juritis, araras, bem-te-vis, sentido o perfume dos araticuns, pequis, mangabas, jenipapos e jatobás.
Os pais das Marias eram o Sr. Argemiro e a D. Diadorina, fazendeiros, trabalhadores tementes a Deus. Para o sertanejo, o nome é muito importante, e é comum batizar os filhos com os nomes dos pais, avós e santos de sua devoção.
A primogênita da família do Sr. Argemiro e D. Diadorina recebeu o nome de Francisca, em homenagem ao Rio São Francisco; a segunda filha foi batizada Maria das Dores, em honra a Nossa Senhora do Encontro e a mais nova das Marias recebeu o nome de Maria Geralda, uma devoção a São Geraldo, padroeiro de Curvelo e santo de fé da família.
A família montou uma hospedaria na fazenda para o descanso dos tropeiros, boiadeiros, aventureiros, pescadores cansados de viajar a pé, em carros de boi ou no lombo de animais. Eles atravessavam o Rio São Francisco em dois pontos distintos: Pirapora e na região da fazenda do Sr. Argemiro. Os viajantes se referiam à hospedaria como “As Três Marias”. E diziam: “Hoje vou pemoitar nas Três Marias “Quando atravessar o rio, vou almoçar nas Trê Marias”.
As Marias eram sertanejas muito bonitas. Gostavam de andar pelo mato, vendo o nascer do sol nas palmas dos coqueiros, dos buritis; retirar o mel de abelha, pescar, nadar no rio de todo dia. Também ajudavam nos afazeres domésticos. Preparavam licores de banana, abacaxi, jenipapo, jabuticaba; faziam rapadura, farinha de mandioca, doce de leite, mingau de milho verde, pamonha, sabão decoada e outros serviços domésticos.
As Marias acreditavam no Caboclo d’Água, alma penada, encosto, pai- de-santo, cartomantes, lobisomem, mula-sem-cabeça, saci-pererê. Todos os domingos de manhã, oravam, cantavam hinos de louvor a Deus, liam as Escrituras Sagradas. Muito religiosas, bebiam água de muitos rios. No sertão onde tudo é certo, incerto, as Marias eram as donas do tempo. Eram as donas do dia e da noite.
A casa das Marias era uma construção antiga, feita de adobe, caiada de branco e tinha muitos cômodos. Na frente da casa havia um varandão, um gramado bem verdinho, uma gameleira centenária, árvores do çerrado: ipê amarelo e roxo, aroeira, jatobá, jenipapo, quaresmeira, buriti, uma vereda de águas finas que dava boas-vindas aos visitantes. No quintal, um rego d’ água, um monjolo, terreiro de terra batida onde galinhas d’angola e outras aves ciscavam, enquanto os porcos, no chiqueiro, fuçavam o dia inteiro. Havia
também o pomar: laranjeiras, mangueiras, goiabeiras, tamarindeiros, limoeiros, bananeiras, mamoeiros, pés de cana e bambu, abacateiros, jabuticabeiras e outros pés de pau. Na porta da cozinha, horta de legumes, verduras e plantas medicinais como erva-cidreira, funcho, losma, boldo, macela e outros. Na cozinha, uma grande fornalha toda barrelada de cinza, onde ardia o fogo noite e dia. Uma chaleira de ferro conservava a água fervendo para coar o café e para outras serventias.
Certo dia, como de costume, as três Marias foram se banhar no Rio do Chico. Criadas nas barrancas do rio, elas nadavam como peixe. As Marias não sabiam que se estava formando uma grande enchente rio acima. Elas mergulhavam, nadavam alegres e felizes. De repente as águas ficaram revoltas, nervosas, arrastavam animais, árvores, plantações, carregando e destruindo tudo por onde passavam. As águas foram se aproximando, chegando cada vez mais rápidas, mais fortes, mais agressivas, mais barulhentas. As aves e os animais se calaram ante a fúria da natureza. O rio tornou-se uma coisa monstruosa, que salivava, cuspia, roncava como.uma besta e fumegava como um vulcão.
As três Marias, ao sentirem a chegada das águas, tentaram desesperada- mente sair do rio, mas Maria Geralda rodou. Maria Francisca tentou agarrá-la, salvá-la e rodou também. Quando Maria das Dores viu suas irmãs se debatendo nas águas numa luta mortal, tentou levá-las para as margens do rio. Todo esforço foi em vão. As águas rodopiavam nas entranhas da terra, levantavam marés, redemoinhos e carregaram em seus braços as três Marias.
O rio ensandeceu, enlouqueceu; ficou furioso, descontrolado. As Marias desapareceram nas águas e o rio ficou de luto. Após o trágico acidente, o nome das três Marias tornou-se mais popular ainda, ficando a região conhecida pelo nome de Três Marias.
As pessoas dizem que durante as noites de lua cheia, quando o rio fica prateado e passa, passeando, silenciosamente, misteriosamente, ouve-se o canto das três Marias enaltecendo o grande sertão, as veredas, as cachoeiras, os pescadores, o caboclo d’água, a Tara, o grande Rio do Chico, os pássaros e os futos do cerrado.

http://www.tresmarias.mg.gov.br/PORTAL.ASP?COD_PORTAL=1&COD_PAGINA=2&COD_SECAO=3&COD_CATEGORIA=5&COD_ARTIGO=343

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